Com 18 anos recém-completados, o garoto que passou por várias escolinhas da cidade hoje integra o sub-20 do Corinthians e da Seleção Brasileira e tem objetivo definido: jogar na Europa

Categoria: ESPORTE
Publicado em: 15/01/2021 08:47:14

É fato que nas escolinhas de base – principalmente as que contam com apoio público – a principal tarefa é a formação de cidadãos, com atenção especial a valores como respeito e disciplina, que formam o caráter de uma pessoa. Se o jovem apresenta um dom natural para alguma modalidade esportiva, passa a ser responsabilidade das escolinhas, também, a formação de atletas de alto rendimento.

Foi o que aconteceu, em Guará, com Cauê Vinícius dos Santos.

O garoto, que curiosamente cresceu perto do ginásio municipal de esportes e do campo da Associação Atlética Guaraense (AAG), demostrou grande potencial para o futebol. Cauê frequentou, desde os dez anos, vários projetos que funcionam na cidade. Hoje, aos 18 anos, é considerado uma das grandes promessas do futebol pentacampeão do mundo.

Cauê integra o elenco sub-20 do Corinthians – e também da Seleção Brasileira. As atuações dele pelo time paulista nas competições da categoria chamaram a atenção do técnico André Jardine, que em dezembro o convocou para um torneio quadrangular disputado na Granja Comary, em Teresópolis-RJ.

Com Chile, Peru e Bolívia, o quadrangular foi a última etapa de preparação do selecionado brasileiro para o Campeonato Sul-Americano Sub-20, em fevereiro, na Colômbia. O Brasil sagrou-se campeão do torneio preparatório ao empatar com o Chile por 1 a 1 – gol de Cauê. Na estreia, contra o Peru, ele também havia marcado, na vitória por 2 a 0.

No Corinthians, clube com o qual tem contrato até março de 2022, Cauê é tratado como joia rara, a ponto de chamar a atenção do técnico da equipe profissional, Vagner Mancini. Há poucas semanas, em uma coletiva de imprensa, o treinador afirmou: “Cauê está sendo observado, foi para a Seleção. Ele e mais alguns devem fazer parte do nosso elenco lá na frente”.

O que levou Cauê ao Corinthians foram a habilidade com a bola e o caminhão de gols que ele fez desde que, muito pequeno, passou a frequentar as escolinhas de futebol de Guará, cuja trajetória, nesta reportagem, é relatada pelo pai dele, Edson Roberto dos Santos, o Edinho, um projetista mecânico que, de futebol, ele mesmo reconhece, tem só o nome – homenagem do avô de Cauê a Edson Arantes do Nascimento.

O início, conta Edinho, foi na escolinha do Bodinho, o 15 de Novembro, pelo qual disputou a Copinha de Guará na categoria sub-10. Da Vila Matarazzo, Cauê passou a treinar no Águas de Guará, projeto comandado pelo ex-jogador Daniel, o Dié, lateral-esquerdo que, no ápice da carreira, jogou no São Paulo.

Enquanto isso, Cauê também mostrava talento nas peladas de futsal na quadra do parquinho que fica ao lado do Colégio Helena Telles. Foram aquelas peladas sem compromisso que inspiraram o pedreiro Marivaldo a reunir uma garotada em torno de um projeto hoje conhecido como Univille.

Pelo Univille, Cauê disputou e conquistou a Copinha de Guará de 2016, demonstrando uma habilidade incomum e faro de gol, despertando atenção dos conhecidos “olheiros” de futebol. “O pessoal do Novorizontino viu. E não me deram mais sossego”, lembra Edinho.

Aprovado

A insistência deu resultado: o pai decidiu levar Cauê a Novo Horizonte para testes. Antes, porém, o garoto, então com 14 anos, passou pelas mãos de Daniel Gibi, ex-jogador profissional que o treinou intensivamente, com fundamentos, durante algumas semanas, no campo da Vila Vitória. No Novorizontino, uma semana de avaliação foi suficiente para o clube convocar Edinho para um papo reto. “Me chamaram para uma sala da diretoria e falaram: o moleque é nosso!”

Ato contínuo, diz o pai de Cauê, o clube apresentou a eles o alojamento da base e pediu a documentação do garoto, para matriculá-lo na escola e inscrevê-lo para o Campeonato Paulista Sub-15 de 2017.

O bicho pegou mesmo foi no ano seguinte. Pelo Novorizontino, oficializado como o clube formador de Cauê, o garoto, aos 16 anos, jogou a Taça Belo Horizonte, uma das mais prestigiadas do País, acompanhada, todos os anos, por observadores de grandes equipes daqui e de fora. “Cauê arrebentou”, afirma Edinho. “E chamou atenção de Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Atlético Paranaense e até do PSV, que queria levá-lo imediatamente para ficar um mês na Holanda; achei melhor não.”

Na passagem por Novo Horizonte, segundo Edinho, Cauê anotou 24 gols em 22 jogos. A impressionante marca superior a um gol por partida fez com que o Corinthians o contratasse. Ainda com 16 anos de idade, o garoto de Guará foi incorporado ao elenco sub-17 corintiano. Em 2019, jogou o Paulista e o Brasileiro da categoria. “Fez gol e não saiu mais do time”, diz Edinho. Segundo ele, foram 12 gols no campeonato estadual e oito no nacional.

Pai presente

Desde que saiu de Guará para o Novorizontino, Cauê é acompanhado de perto pelo pai. Com a possibilidade real de que o filho se tornasse um jogador profissional, Edinho deixou a serigrafia que havia montado depois de 28 anos como projetista mecânico da Busa, um dos maiores fabricantes mundiais de peças e equipamentos para a cultura de algodão.

Na serigrafia, Edinho contava com a ajuda de Cauê, que, antes, havia trabalhado em uma padaria. Agora, ambos moram em São Paulo. Ambos, vírgula. Edinho se transferiu para a capital paulista com toda a família: a esposa Claudete e o filho mais novo, Iago – o mais velho, Iuri, é engenheiro mecânico em Guará. Com 12 anos, Iago também integra as categorias de base do Corinthians. A família mora em um apartamento em frente ao Parque São Jorge, no Tatuapé.

É de lá que Edinho comanda a rotina de Cauê, no leva-e-traz diário pelo infernal trânsito paulistano e nos contatos com dirigentes e empresários ligados a clubes do Brasil e do exterior. Com a assinatura de contrato com o Corinthians, o assédio diminuiu, mas já foi intenso, ocasião em que Edinho teve que recorrer ao inglês macarrônico que aprendeu nos tempos de Busa.

“Eu trabalhei com o Hans, um engenheiro mecânico holandês que pediu para eu lhe ensinar português. Eu falei: vamos trocar, parceiro; eu te ensino português, você me ensina inglês. Desde então, até que me viro bem”, afirma Edinho.

Biotipo para europeus

Cauê, que completou 18 anos em novembro passado, cresceu três centímetros desde que chegou ao Corinthians. Está com 1,87 metro e, pelo físico espigado, é chamado por lá de “mini Jô”, em referência ao centroavante titular, de 1,90 m, destaque da equipe na conquista do Brasileirão de 2017.

Além dos treinos no CT corintiano, Cauê frequenta uma academia especializada em medicina esportiva, com o objetivo de aprimorar um condicionamento físico específico para o biotipo dele – biotipo que chama particular atenção dos olheiros estrangeiros. “Todo mundo diz que ele tem o biotipo ideal para os campeonatos europeus”, relata o pai. “E também o lado técnico, de muita movimentação, habilidade, bom passe, força física”, enumera Edinho, que arremata: “A meta dele é a Europa”.

O sonho não parece tão distante assim. No começo de 2020, o jornal Marca, da Espanha, divulgou uma lista das maiores promessas do futebol mundial. Entre os dez jogadores mais promissores do Brasil, de acordo com a publicação espanhola, estão Gabriel Verón, do Palmeiras; Antony (então no São Paulo, vendido no meio do ano ao Ajax por R$ 74 milhões); Talles Magno, do Vasco; Kaio Jorge, atualmente destaque do Santos na Libertadores; Lázaro, do Flamengo; e, também, um certo moleque que se divertia nas peladas de futsal no parquinho do Helena Telles.